Caminhos da Reportagem mostra buscas por navio escravista naufragado
A edição inĂ©dita do programa Caminhos da Reportagem que a TV Brasil exibe neste domingo (6), Ă s 22h, revela as buscas por vestĂgios do brigue Camargo, navio escravista naufragado em Angra dos Reis, no litoral fluminense, no fim de 1852. O caso ficou na memĂłria do Quilombo Santa Rita do BracuĂ, tambĂ©m localizado em Angra, onde o fato vem sendo contado e recontado há várias gerações, fazendo da histĂłria oral uma arma poderosa na defesa do territĂłrio.
“NĂŁo foi um acidente, foi uma chacina”, afirma a liderança quilombola Luciana Adriano da Silva, já que muitos dos africanos transportados forçadamente teriam sido abandonados para morrer no mar. Encontrar a embarcação e “fazer esta denĂşncia para o mundo Ă© uma das formas de reparação por tudo o que os nossos antepassados sofreram,” completa.
Passados 170 anos do naufrágio, arqueĂłlogos mergulham na BaĂa da Ilha Grande para buscar o brigue Camargo, envolvido em um dos episĂłdios mais emblemáticos do perĂodo em que o tráfico transatlântico de africanos escravizados já havia sido proibido no Brasil, mas continuava a ocorrer de forma clandestina debaixo das vistas grossas das autoridades. Segundo o arqueĂłlogo LuĂs Felipe Santos, presidente do Instituto AfrOrigens, existem diversos achados, alguns compatĂveis com o perĂodo estudado. Mas ainda serĂŁo feitas análises antes da conclusĂŁo da pesquisa.
Em dezembro de 1852, o capitĂŁo norte-americano Nathaniel Gordon trouxe 500 moçambicanos para serem escravizados nas fazendas de cafĂ© do Vale do ParaĂba. Perseguido pela patrulha naval, afundou o barco e fugiu disfarçado de mulher. Dez anos mais tarde, depois de ser pego no comando de outra embarcação escravista, Gordon foi a primeira e Ăşnica pessoa a ser julgada e enforcada pelo crime de tráfico de africanos nos Estados Unidos, diz o documentarista Yuri Sanada, diretor da produtora Aventuras Produções e roteirista de um filme a ser produzido sobre o malfadado capitĂŁo.
Aqui no Brasil, a polĂcia entrou nas fazendas para apreender os africanos recĂ©m-chegados e investigou os fazendeiros envolvidos na organização criminosa. Era a primeira vez que o impĂ©rio brasileiro tomava uma atitude em relação ao tráfico ilegal, afirma Martha Abreu, professora do Instituto de HistĂłria da Universidade Federal Fluminense. “Chegaram outros navios? Podem ter chegado, mas realmente a partir do Camargo foi um sinal, olha, nĂŁo dá mais”.
Um dos envolvidos no escândalo era o comendador JosĂ© de Souza Breves, proprietário do antigo engenho Santa Rita do BracuĂ, atual territĂłrio do quilombo. Segundo a griĂ´ e coordenadora da Associação de Remanescentes do Quilombo Santa Rita do BracuĂ (ARQUISABRA), Marilda de Souza Francisco, a propriedade era na verdade uma fachada para o tráfico. Uma estrada que passava por dentro da fazenda levava os africanos aos cafezais da cidade de Bananal, no interior de SĂŁo Paulo.
Depois de mais de um sĂ©culo de resistĂŞncia e batalha por reconhecimento, o quilombo está prestes a receber o tĂtulo das terras pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e espera que a histĂłria do brigue Camargo nĂŁo seja esquecida. Uma das ideias em discussĂŁo Ă© que o local do naufrágio se torne um ponto de visitação turĂstica em benefĂcio da comunidade.
As buscas sĂŁo financiadas pelo Slave Wrecks Project, da rede americana de museus Smithsonian, que rastreia naufrágios no oceano Atlântico. Nos Ăşltimos anos, navios escravistas já foram encontrados nos Estados Unidos e em Moçambique. “A proposta do projeto Ă© fazer com que este passado seja Ăştil no presente”, diz Stephen Lubkemann, co-diretor do Slave Wrecks Project.
Se os pesquisadores de fato encontrarem o brigue Camargo, será um feito inĂ©dito. “O apagamento histĂłrico Ă© muito forte. A nossa pesquisa Ă© a primeira de um navio escravagista no Brasil, depois de tantos e tantos anos,” afirma o arqueĂłlogo Julio Cesar Marins.
Ficha técnica
Reportagem e edição de texto: Ana Passos
Reportagem cinematográfica: Rodolpho Rodrigues
AuxĂlio tĂ©cnico: Cláudio Tavares
Produção: Ana Passos, ĂŤcaro Matos e ThaĂs Chaves
Edição de imagem e finalização: Diego Lourenço e Ubirajara Abreu
Tradução: Mario Nunes
Arte: Alex Sakata e Caroline Ramos
Tema do programa: Ricardo Villas
Pesquisa de trilhas: Tereza Eustáquio
Sobre o programa
Produção jornalĂstica semanal da TV Brasil, o Caminhos da Reportagem leva o telespectador para uma viagem pelo paĂs e pelo mundo atrás de grandes histĂłrias, com uma visĂŁo diferente, instigante e complexa de cada um dos assuntos escolhidos.
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Exibido aos domingos, Ă s 22h, o Caminhos da Reportagem disponibiliza as matĂ©rias especiais no site http://tvbrasil.ebc.com.br/caminhosdareportagem e no YouTube da emissora pĂşblica em https://www.youtube.com/tvbrasil. As edições anteriores tambĂ©m estĂŁo no aplicativo TV Brasil Play, disponĂvel nas versões Android e iOS, e no site https://tvbrasilplay.com.br/.
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